terça-feira, 26 de novembro de 2013

BEM VINDO A BEJA PROFESSOR SANTANA CASTILHO

Santana Castilho, o orçamento de 2014 para a educação e em particular a sua visão sobre o ensino especial.
"do porquê deste blogue"




OS DEVORISTAS

Publicado no Público de 23 de Outubro, retirado daqui

A proposta de orçamento para 2014 prevê uma redução de 969 milhões de euros com funcionários públicos. Metade desse corte (565 milhões) será feito com a redução da despesa do pessoal do ensino não superior (redução de salários e diminuição de efectivos). A verba consignada à educação pré-escolar sofre um corte de 67,5 milhões de euros. Significativamente, as transferências previstas para o ensino privado não só não sofrem qualquer corte como crescem dois milhões de euros, totalizando 240 milhões. Globalmente, estamos perante um corte de 8% face ao ano transacto, altura em que atingimos o menor esforço com a educação, em relação ao PIB, em 39 anos de democracia. Passos Coelho e Nuno Crato julgam-se predestinados como tiranos, sem noção do mal que semeiam. Em dois anos de subserviência ao estrangeiro, aproveitando um conformismo que se banalizou, traçaram uma linha de costa que divide o país em dois: um litoral, concentracionário, e outro interior, desertificado. Tal linha virtual permitiu a metáfora recorrente: quando o Governo invoca melhoria da eficiência e aproveitamento de recursos, sabemos que se refere ao encerramento de milhares de escolas e ao despedimento de 38.000 professores. E se já era problema grande a desigualdade que caracterizava o sistema, agora ganhou foros de escândalo. Com efeito, enquanto crescem as transferências do dinheiro público para o ensino privado, diminuem drasticamente as verbas para o ensino público. Enquanto aumenta a autonomia do ensino privado, diminui a autonomia das escolas públicas. A capacidade de decisão das escolas públicas para criarem cursos profissionais e os recursos inerentes foram fortemente cerceados, enquanto o sentido inverso nos estabelecimentos particulares se tornou diariamente patente na folha oficial da República. Os apoios, não importa de que índole, disponibilizados para combater o insucesso e o abandono precoce do ensino público desapareceram. As crianças com necessidades educativas especiais foram, sem qualquer réstia de pudor, consideradas meros apêndices administrativos e liminarmente segregadas das turmas do ensino regular. A falácia do ensino dual reconduziu-nos à escola do Estado Novo: curta e pobre para os pobres, rica e financiada pelos impostos de todos para as famílias privilegiadas.


O regresso ao ensino elitista 


No Público de 20 de Novembro, retirado daqui
A ascensão de Nuno Crato ao poder foi promovida por duas vias: o seu populismo discursivo, de que a desejada implosão do ministério foi paradigma, e a influência poderosa de grupos para quem a Educação é negócio. Chegou agora o momento em que o aforismo emblemático de César das Neves começa a colher prova no terreno das realidades: não há almoços grátis! O recentemente aprovado estatuto do ensino privado mostra ao que Crato veio e para quem trabalha. O seu actual direitismo, socialmente reacionário, está próximo, em radicalismo, do seu esquerdismo de outros tempos. O fenómeno explica-se, tão-só, por simples conversão de interesses e ambições aos sinais dos tempos. O resultado que se desenhou e ganha agora forma é o retorno a um sistema de ensino elitista, onde muitos serãoexcluídos

O senhor 33 e outros 3

 No Público de 9 de Setembro de 2013 retirado daqui
2. Há dias foi tornado público um relatório de actividade das comissões de protecção de crianças e jovens em risco. Esse documento qualifica como muito significativo o aumento das situações que comprometem o direito à educação. E quantifica o fenómeno: 22,2 % dos casos registados no primeiro semestre de 2013 são violações dos direitos dos menores à educação. Foram registados sob esta epígrafe 3.147 novos casos. O absentismo e o abandono escolar já são a segunda maior ameaça a menores na tipologia adoptada pela Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco (CPCJR).

Desde 2010, 135.000 carenciados deixaram de receber o Rendimento Social de Inserção (RSI). Este ano já foram excluídos 20.000 beneficiários. As continuadas alterações às regras de concessão multiplicaram pelo país fora bolsas de sofrimento atroz, onde os direitos humanos básicos não existem. Para milhares de crianças, a esperança que uma escola inclusiva as acolha vai de passo síncrono com a esperança dos pais em serem socialmente integrados.

Se compulsarmos proclamações e discursos de economistas, sociólogos e políticos, se percorrermos os documentos de avaliação e prospectiva das instituições transnacionais, impõe-se a qualquer observador um denominador comum: a educação é fonte de riqueza e o melhor veículo de inclusão e promoção social. Este papel da educação, universalmente reconhecido, deveria, em tempos de crise, suscitar reforço de empenhamento do Estado. Porque há uma relação incontornável entre economia e educação. Porque o relaxamento do esforço com a educação torna a crise crónica. Pior que o empobrecimento da bolsa e das bolsas é o empobrecimento do conhecimento e do espírito.

As “swapadelas” de Crato e as piruetas de Grancho


No público de14 de Agosto de 2013, retirado daqui
Duas velhas frentes adormecidas foram reabertas para apressar a implosão do ensino público: o exame de acesso à profissão docente e o cheque-ensino. A manobra justifica público comentário. 

Comecemos pelo exame e por um aspecto menos tratado, expediente comum à dupla Lurdes-Crato: não podendo alterar leis-quadro (Constituição da República Portuguesa e Lei de Bases do Sistema Educativo), por carência de maioria qualificada de votos, derrogaram-nas pela via legislativa comum. Assim, quando Maria de Lurdes Rodrigues procedeu à revisão do Estatuto da Carreira Docente (DL nº15/2007), adulterou as condições de aquisição da respectiva qualificação profissional (nº1 do artigo 34º da Lei de Bases), juntando-lhes, sub-repticiamente, uma prova de avaliação de conhecimentos e competências. Mas, nesse momento, a prova era necessária apenas para efeitos de concurso a lugares de quadro (artigos 17º, 22º e 36º do DL nº 15/2007). Quando a excrescência foi regulamentada em 2008 (Decreto-Regulamentar nº3/2008), foi seraficamente aproveitada a oportunidade para mais um atropelo. O que na lei dizia apenas respeito à entrada nos quadros foi estendido a qualquer contrato administrativo. Por peso de consciência e resquícios de pudor mínimo, a coisa jazeu sem aplicação durante seis anos. Recuperando-a agora, o Ministério da Educação e Ciência vem, como anteriormente escrevi, reiterar dois factos: que não confia nas instituições de ensino superior que formam professores e que os professores não podem confiar no Estado. Com efeito, as universidades e os politécnicos que formam professores não são organizações clandestinas. Foram reconhecidas pelo Estado como competentes para tal. Para operarem têm que obedecer às exigências do Estado, designadamente no que respeita aos planos de cursos. O Estado fiscaliza-as e pode fechá-las, se deixar de lhes reconhecer qualidade. O Estado é, pois, tutor de todas. Mas, mais ainda, o Estado é dono da maioria. Neste quadro, a prova de avaliação de conhecimentos e competências mostra que o Estado não confia nelas nem em si próprio. E não venha o secretário de Estado Grancho com os argumentos que usou para responder à matéria, na última edição do Expresso. Dizer que noutras profissões também é assim, citando magistrados, médicos ou arquitectos, patenteia ignorância ou desonestidade intelectual. Das escolas de formação de professores sai-se, legalmente, com um título profissional e uma licença para exercer uma profissão. Das faculdades de direito não se sai magistrado. Sai-se com um conhecimento que abre portas para diferentes profissões, a que se chega mediante formação e exames complementares. Das faculdades de medicina não se sai médico, como das escolas de arquitectura não se sai arquitecto. Uma e outra profissão são tituladas pelas respectivas ordens, que as regulam. Dado o envolvimento de longos anos do secretário de Estado Grancho na criação de uma Ordem de Professores, ainda que falhado, a pirueta que protagonizou no Expresso inclina-me a concluir que, das duas hipóteses, se trata de desonestidade intelectual. Sustentar, como sustentou, no refinado “eduquês” que Crato combatia, a necessidade de usar a prova de acesso para aferir “capacidades transversais”, que, especificou, visam “a mobilização do raciocínio lógico, a resolução de problemas ou a capacidade a nível da leitura e da escrita”, em professores que somaram um mestrado (alguns até um doutoramento) a uma licenciatura, exercem a actividade docente, sucessivamente avaliada com as notas máximas, há 10 e mais anos e agora são equiparados a crianças do ensino básico, é atirar lama sobre quem devia respeitar e cobrir de ridículo as tretas, vemos agora, que apregoava quando era presidente da Associação Nacional de Professores. 
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3. O direito à Educação, que o Estado deve proteger, e o dever de cumprir o ensino obrigatório, que o cidadão deve cumprir, não cabem, em minha opinião, na lógica económica da simples prestação de serviços. Reclamo para o Estado um papel social e de soberania que o obriga a cooperar com cada estabelecimento de ensino, por mais recôndita que seja a sua localização, na missão constitucional de responder às necessidades de desenvolvimento das pessoas e das regiões em que vivem. A “liberdade de escolha” tem, constitucionalmente, que ser precedida pela garantia da igualdade de oportunidades. 

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