terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Tribunal Europeu condena Portugal no caso da mãe a quem foram retirados sete filhos



(actualizado às )

Tribunal Europeu dos Direitos do Homem diz que autoridades portuguesas devem reexaminar o caso. E que o Estado deve pagar 15 mil euros à mãe das crianças. Ministério da Justiça diz que se está a "avaliar se existem fundamentos para interpor recurso".
https://www.publico.pt/sociedade/noticia/portugal-condenado-por-tribunal-europeu-no-caso-da-mae-a-quem-foram-retirados-sete-filhos-1723450?frm=pop
Tribunal europeu: "O recurso à esterilização nunca pode ser uma condição para [alguém] conservar os seus direitos parentais.” Rui Gaudêncio
 
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) diz que Portugal violou os direitos humanos no caso de Liliana Melo a quem a Justiça mandou retirar, em 2012, sete filhos para adopção. Em causa está o artigo n.º 8 da convenção dos direitos humanos (“direito ao respeito pela vida privada e familiar”) que o tribunal entende não ter sido respeitado ao terem sido afastadas as crianças da família.
A avaliação dos sete juízes que analisaram o caso é dura: a colocação das crianças “não foi apropriada”, tendo em conta “a ausência de condutas violentas [na família], a existência de fortes laços afectivos e o falhanço dos serviços sociais em mitigar a privação material vivida pela senhora Soares de Melo, que tinha que criar um grande número de filhos quase sem ajuda”. É o que diz o comunicado do TEDH que sintetiza a análise feita ao processo.
Mais: a retirada das crianças e a sua distribuição por três instituições de acolhimento distintas (o mais novo dos menores tinha apenas sete meses e o mais velho dez anos) foi uma medida “contrária aos melhores interesses” dos irmãos, que, segundo se lê no texto da sentença do TEDH, foram separados e ficaram "impedidos de manter os laços fraternais".
Os tribunais portugueses falharam, igualmente, ao não ordenarem que fosse feita “uma avaliação psicológica independente, que analisasse se a senhora Soares de Melo tinha maturidade e capacidade para criar os filhos”.
O TEDH entende que houve também violação do artigo n.º 8 da convenção dos direitos humanos quando, “a decisão de colocação das crianças em instituições" teve em consideração o facto de Liliana Melo se ter recusado a fazer uma laqueação de trompas, algo que constava de um polémico acordo de promoção e protecção dos menores que tinha sido estabelecido pelos serviços sociais com a família Melo, em 2009. Na visão deste tribunal, "o recurso à esterilização nunca pode ser uma condição para [alguém] conservar os seus direitos parentais".
O TEDH determina que o Estado pague 15 mil euros a Liliana por danos morais. Mas, sobretudo, os juízes deste tribunal europeu defendem, por unanimidade, que “as autoridades do país devem reexaminar, a curto prazo, a situação da requerente e dos seus filhos à luz do presente julgamento e adoptar as medidas apropriadas no superior interesse das crianças”.
As crianças têm actualmente entre quatro e 11 anos. Seis encontram-se a viver em diferentes instituições de acolhimento. Uma sétima não chegou a ser localizada pelas autoridades em 2012 e viverá com familiares. A mãe garantiu várias vezes que está bem.
Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Justiça fez saber, através do seu gabinete de imprensa, que “o Estado encontra-se a analisar a decisão do TEDH e a avaliar se existem fundamentos para interpor recurso (decisão que deverá ser tomada no prazo de três meses), tendo sempre em vista garantir a defesa dos superiores interesses das crianças”.
Caso não haja recurso, "os tribunais terão de reanalisar" o processo, diz a mesma fonte. "No entanto, os tribunais portugueses ainda não se pronunciaram em definitivo" sobre este caso, sublinha, uma vez que se aguarda ainda uma “decisão a proferir pelo Tribunal Constitucional”.
TEDH diz que Liliana ficou à margem
Depois da decisão do tribunal de Sintra, de Maio de 2012, que retirou os filhos a Liliana Melo, esta a cabo-verdiana, que reside em Portugal há mais de duas décadas, esteve impedida de os visitar durante quase três anos. Ao longo desse período, sucessivos requerimentos e recursos correram em diferentes tribunais. Liliana nunca desistiu. Queixou-se, por fim, ao Tribunal Europeu por não poder visitar os filhos.
Em Fevereiro do ano passado, o TEDH entendeu que o Estado tinha que criar condições para que a mãe contactasse as crianças até que o processo acabasse (e desde 15 de Março que as visitas acontecem regularmente).
Agora o TEDH vai mais longe: ao ter sido impedida de fazer visitas, apesar de várias vezes Liliana o ter solicitado, os juízes dizem que o artigo 8 da convenção foi, também aqui, violado pelo Estado português
 

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